Diário de Bordo

Sabe, cada vez mais me sinto descolada da realidade em que estou inserida. Inevitavelmente faço parte disso tudo, mas não sou parte de nada. É só olhar as pessoas à minha volta, são todas tão diferentes de mim, em todos, absolutamente todos os sentidos. Sou uma mulher trans num mundo cisnormativo. Lésbica onde a heterossexualidade predomina. Mulher num mundo machista. Esquerdista numa era onde a direita conservadora predomina. Em prol do amor e da empatia onde o que impera é o ódio e o preconceito. Ateia num país predominantemente cristão. Tenho o intenso desejo de mudar o mundo numa realidade onde as pessoas só querem pagar as contas e se embriagar de alguma coisa. Me sinto muito sozinha, como um espécime fora de seu habitat natural, só que o mais desesperador é que sinto que não tenho casa, me sinto estrangeira de todo lugar. Fico me perguntando: onde estão os meus? Será que existe algum lugar que as pessoas sejam um pouco mais parecidas comigo e/ou que eu possa me sentir mais acolhida ou aconchegada?

Sinto que por mais que eu tente explicar e por mais bem intencionadas que sejam algumas pessoas, nunca consigo me fazer entendida de maneira satisfatória. É como se eu visse o inferno em detalhes onde pra maioria está tudo bem. É como se ninguém visse o mundo da mesma forma que eu vejo, e, observar essa paisagem dantesca sozinha é agonizante.

Ultimamente a maioria das pessoas me entediam e/ou me irritam, pois sinto que o que são e o que tem pra oferecer são tão distantes de mim, tão raso, tão vazio. Juro que ando me esforçando pra ter paciência e compaixão, mas a falta de reciprocidade frequente me frustra muito. De verdade, não entendo as pessoas, não entendo essa raivosidade toda, esse egoísmo todo, toda essa insensibilidade. Olho à minha volta e vejo pessoas cinza, alimentadas pela hipocrisia dos valores pseudo-moralistas enquanto destilam ódio contra quem é diferente. É como se o prazer maior estivesse na desgraça alheia. É algo triste e que me entristece muito também.

O que tá acontecendo? Onde o mundo está indo parar? Cada dia tenho mais certeza que não sou daqui. Queria muito encontrar uma espécie de nirvana, feito de pessoas mais amenas, sensíveis e humanas, para assim sentir que voltei pra casa. Mas por enquanto continuo me sentindo uma imigrante ilegal nesse mundo de gente amarga e rude.

Boa estadia à todos.

Beijos de luz.

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